sexta-feira, 23 de maio de 2008

Apenas um diálogo trovadoresco

- Eu e você
- Você e eu

- Nós
- Arremates
- Estás indiferente
- Estou bem aqui
- Parece a quilômetros de distância
- O que vale é o momento
- Mais vale o pensamento
- Quanto daria por ele?
- As nuvens que choram e as estrelas que cegam
- Não pode com tamanhas moedas pagar
- Não me deixa ao menos tentar?
- Seu incômodo deve ter algum motivo
- Talvez o seu modo tão altivo
- Equivoca-se
- Transforma-se
- Julga errado
- Traduzo o que vejo
- Não pode a tudo enxergar
- É a confissão de teu segredo
- Coloca palavras em minha boca
- Perdoe meu errôneo lampejo
- Devo mesmo confessar?
- Meu maior desejo!
- Não há o que dizer
- Não é exatamente o que vejo
- Por favor, pare
- Peço que continue
- Ah, não
- Oh, não
- Agora falamos a mesma língua?
- És aquilo que sinto
- Vamos entrar, inicia-se a chuva
- Vai você, quero com as frias gotas conversar
- Irá resfriar-se
- Importa-se?
- Não deveria?
- Não irei me molhar
- E irá a chuva secar?
- Deixarei-a confundir-se com minhas lágrimas
- Choras?
- Sua dúvida me fere
- Não consigo perceber
- Impossível me conter
- Adeus
(entra)
- Oh, chuva, me consuma como a uma montanha de sal.
E me leve por este estreito bueiro.
Pois é num esgoto escuro e abandonado.
Que mereço estar após ter um amor recusado.
(consome-se)

domingo, 18 de maio de 2008

Quem é você na aula?

MUITO INTERESSANTE o que encontrei por acaso no site PHD Comics. É um divertido infográfico que diz quem você é na sala de aula ou seminários analisando o lugar onde costuma se sentar. E então, com qual desses seis personagens você mais se parece? [clique aqui para ver a tira original]

quinta-feira, 15 de maio de 2008

O Retrato de Dorian Gray

“COSTUMA-SE DIZER QUE a beleza é somente superficial. Pode ser que seja. Mas não tão superficial, pelo menos, como o pensamento. Para mim, a Beleza é a maravilha das maravilhas. Só o medíocre não julga pelas aparências. (...) Ah! Aproveite a sua juventude enquanto a tem. Não esbanje o ouro dos seus dias, dando ouvido aos tediosos, tentando melhorar o fracasso sem esperança ou desperdiçando sua vida com ignorantes, com o fútil, com o vulgar. São estes os objetivos doentios, os falsos ideais da nossa época. Viva! Viva a maravilhosa vida sua! Não perca coisa alguma dela. Busque sempre novas sensações. Que nada o atemorize.” [clique na imagem para ver o quadro]


O RETRATO DE DORIAN Gray (1890), de Oscar Wilde, é um romance sobre a corrupção da beleza. Nele, o jovem e belo Dorian possui a dádiva de jamais envelhecer, ao contrário do retrato dele pintado pelo talentoso Basil Hallward, que depositara nesta sua verdadeira obra-prima demasiado de si mesmo, uma vez que se tornara obcecado pelo seu gracioso modelo. A citação acima é de um dos diálogos do mais atraente personagem da trama, Lord Henry Wotton, cujas filosofias influenciam o até então ingênuo Dorian Gray que, ao perceber que a sua figura gravada na pintura de Basil jamais envelheceria, desejou que acontecesse o oposto: “Se eu ficasse sempre jovem, e esse retrato envelhecesse! Por isso – por isso – eu daria tudo! Sim, não há nada no mundo que eu não desse! Daria até a minha própria alma!” E é o que acontece.

O MAIS INTERESSANTE do livro é a maneira como a personalidade de Dorian vai se modelando com o passar do tempo. Acaba se envolvendo em alguns crimes dos quais jamais é suspeito, conservando intocado o seu invejoso semblante juvenil, mesmo no auge de seus quarenta anos. Enquanto isso, a sua alma aprisionada no quadro vai se tornando cada vez mais velha, enrugada e repugnante.

WILDE É AUTOR DE belíssimos poemas e contos, muitos deles sobre a beleza. Há uma inteligente conclusão sua sobre o mito de Narciso, um rapaz que todos os dias ia contemplar o rosto num lago e acabou morrendo afogado (no lugar onde caiu nasceu uma flor, que passamos a chamar de Narciso):

ELE DIZ QUE QUANDO o jovem morreu, vieram Oréiades (deusas do bosque), e viram que a água doce do lago havia se transformado em lágrimas salgadas.
– Por que você chora? – perguntaram as Oréiades.
– Choro por Narciso.
– Ah, não nos espanta que você chore por Narciso – continuaram elas. – Afinal de contas, apesar de todas nós sempre corrermos atrás dele pelo bosque, você é o único que tinha a oportunidade de contemplar de perto sua beleza.
– Mas Narciso era belo? – quis saber o lago.
– Quem melhor do que você poderia saber? – responderam, surpresas, as Oréiades. – Afinal de contas, era em suas margens que ele se debruçava todos os dias.
O lago ficou algum tempo quieto. Por fim, disse:
– Eu choro por Narciso, mas jamais havia percebido que Narciso era belo. Choro por ele porque, todas as vezes em que se deitava sobre minhas margens, eu podia ver, no fundo de seus olhos, a minha própria beleza refletida.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Insônia

Um. Dois. Três. Meus passos não fazem barulho no calçamento paralelepipedoquadriculado. Certas vezes pareço chegar como um espectro. Um susto naquele desatento sujeito.
Quatro. Cinco. Seis passos e cruzo a rua estreita ao seu encontro.
Tap-tap-tap. Passos ligeiros produzem maiores ruídos. No entanto, meu grito de desapontamento não emite nada sequer. Ele vem de dentro e fica ali dentro aumentando a minha dor. Você não estava lá. Nem mesmo compensou a travessia. Ora, ninguém estava lá.
Um, dois, três... quatro quintos de hora prá dormir. O cobertor já não me protege como antes. Não há mais motivos para isto. Há pessoas mais importantes para proteger. Sairei com meu cobertor agasalhando aqueles que eu quero bem. Dá prá contar no dedo...
Um, dois, três... dá prá contar no dedo.
Hoje tudo se resume a um. Talvez fique mais confortável assim.
Esta noite não estou de meias. O ponteiro completa a volta suavemente enquanto continuo desperto. Ele percorre o caminho com fúria e faz tanto barulho quanto meus passos.
Tap-tap-tap. Quebra a madrugada de silêncio ensurdecedor. Nada para tocar. Você não me deixa mais dormir. Consome toda a minha insônia. Em minhas ingênuas fantasias somente a sua presença me basta.
E você sempre estará ao meu alcance no outro lado da rua. Enquanto aguardo o advento de meu melancólico despertar.

(Giuseppe Menezes, março de 2007)

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Esta é uma carta de amor. Gosto dela por ser ingênua e simples. A versão original está grardada em mãos seguras. As contagens sequenciais se confundem com o barulho dos passos do ponteiro do relógio, que conduzem ao sono quando menos se espera. Às vezes só percebemos que dormimos quando despertos, não é? E o que esperar encontrar do outro lado da rua? O que vivemos é um sonho do qual talvez acordamos enquanto estamos dormindo.

sábado, 3 de maio de 2008

Nosso rock vai bem, obrigado

NESTAS ÚLTIMAS SEMANAS tenho me dedicado a conhecer um pouco mais sobre a excelente cena musical independente brasileira, de onde surgiram grupos como o Cachorro Grande, que considero a melhor banda nacional em atividade. Aproveitando a estréia do MySpace no brasil, eles colocaram cinco músicas de seu mais recente disco, Todos os Tempos, (o quarto em 9 anos de carreira) para serem ouvidas na íntegra em sua página [confira você também clicando AQUI].

PRÁ FALAR A VERDADE, comecei visitando a página da mais nova queridinha da internet, Mallu Magalhães, que faz um folk'n'roll (como ela mesmo define) cantado em inglês da mais alta qualidade no auge de seus meros 15 anos. Ela ainda não tem um álbum lançado, mas já estreou seu primeiro videoclipe, que eu certamente recomento (assista AQUI). Ela se considera fã de Bob Dylan, Johnny Cash e Vanguart, esta última presente na lista da Rolling Stone brasileira dos 25 melhores discos nacionais de 2007. Os caras do Vanguart têm letras e arranjos muito bem elaborados, levando também um som folck rock, mas com um pé no mundo indie. Tem tudo para se tornar uma das grandes bandas do país. Um outro exemplo de qualidade é o primeiro trabalho dos Los Porongas, igualmente presente na lista citada. Vinda dos confins do Acre, foi uma das que mais me agradaram e são considerados como uma "esperança do rock nacional". Também acredito nesta aposta.

INFLUENCIADOS POR BEATLES, The Strokes e Franz Ferdinand, o Cartolas vem da criativa cena rio grandense do sul e venceram em 2005 o festival Claro Que é Rock. Disponibilizam em sua página 6 faixas de seu primeiro disco. A banda Superguidis também vem do RS e é apontada como uma das melhores da cena independente. Fazem um som à lá Weezer ou Pavement e já conquistaram vários prêmios importantes. O Superguidis me fez lembrar o Sonic Youth, influência assumida de uma outra excelente banda chamada Ludovic, nascida na cena punk de São Paulo no início desta década. Também já levaram grandes prêmios e vêm ganhando uma legião de fãs.

APROVEITANDO O BONDE, aproveitei para conhecer as novas de duas bandas que não ouvia há algum tempo: Autoramas e Bidê ou Balde. A primeira já é consagrada no mercado independente, com mais de dez anos de carreira e 4 bons discos lançados. Os Autoramas jé tem turnê internacional e estão com um videoclipe novo da sua excelente música atual de trabalho [veja AQUI]. O rock'n'roll dos sulistas do Bidê ou Balde continua com a mesma alegria, e o mais recente disco está mesmo muito interessante. Eles participaram recentemente do projeto Acústico MTV Bandas Gaúchas juntamente com Cachorro Grande, Ultramen e Wander Wildner.

DISCORDO COMPLETAMENTE com aqueles que dizem que o rock nacional anda de mal a pior: é que as boas bandas não estão na grande mídia, e esse é justamente o gostinho especial que faz o paralelo mundo independente tão saboroso. Para conhecer ainda mais, confira o rock alcoólatra do Rock Rocket, o grunge de viola do Zefirina Bomba e o punk do Forgotten Boys.